Editorial por Thiago Nasser
Bem-vindo à primeira edição da Revista da Junta Local!
Ela ainda está engatinhando, como boa parte dos pequenos produtores da nossa comunidade. Ela ainda passará por uma adolescência um pouco desengonçada até tomarmos um pouco mais de jeito. Mas, por ora, sabemos que queremos nos aproximar mais do nosso público, trazer mais informações sobre o que anda acontecendo na nossa comunidade, nossa visão sobre a comida e as questões do nosso sistema alimentar. Queremos contar essas histórias de várias maneiras e através de diversas vozes; queremos, principalmente, ser uma alternativa para quem quer fugir da superficialidade e instantaneidade reinante quando o assunto é “o que comer?”. A Junta Local quer que a história por trás da comida vá além dos rótulos do momento: funcional, orgânico, vegano, natural, paleo e até mesmo local. O que importa são os laços e as histórias que se fazem através da comida, de que forma ela nos conecta à natureza, à história, à identidade, à saúde, à cultura e à cidade. Toda essa “densidade” da comida deve ser posta em movimento, deve ser mobilizada para vivermos melhor individualmente e como coletividade.
Toda Revista começará com este momento Megafone, dando sobrevida internética à ferramenta de “mídia social” à qual nos afeiçoamos durante a feira. Nesta seção faremos uma introdução aos artigos da Revista, comentaremos sobre a evolução da Junta Local e meteremos a colher em qualquer outro assunto relevante dentro do mundo da comida.
Não foi de forma proposital, mas todos os artigos desta primeira edição da revista de alguma maneira tocam algum tema central para a Junta Local. Começamos com a dor e delícia do pequeno produtor, a figura central dentro do sistema alimentar que preconizamos. O relato de viagem para o Sítio do Piriquito, sede dos Cogumelos Umami, dentro da série Junta Local Vai, é emblemática pois envolve um produtor que participa da Junta Local desde sua primeira edição em agosto de 2014. Crescemos juntos de Fabrício Andrade e com ele vamos vivendo os dilemas do pequeno produtor. São as suas dificuldades e sucessos que permitem a evolução das nossas plataformas.
O artigo sobre fermentação, escrito por Marcela Correia, da equipe de comunicação da Junta Local e também produtora do K. Probióticos, esclarece dúvidas e, principalmente, defende a fermentação como uma técnica a ser compreendida e dominada por todos. A fermentação, muito mais que uma moda passageira, está no centro de um movimento pela relocalização do sistema alimentar, como defende o seu maior proponente, Sandor Ellix Katz (a introdução de seu livro “A Arte da Fermentação” é um verdadeiro manifesto político). Fermentar significa poder estender a durabilidade de produtos sazonais; significa a troca de saberes entre vizinhos; significa potencializar as miríades de floras de microrganismos que conferem contundência e variedade de sabores. Abaixo a homogeneidade e passividade!
Por sinal, aliás, muitos dos produtores representativos da produção artesanal, utilizam os microrganismos que se encontram de certa forma no “ar” como elemento de transformação, como Michael Pollan colocou em seu livro “Cozinhar”: chocolate, queijo, cerveja e o próprio kombucha são presentes da fermentação, que pode render uma hoste infinita de produtos que temos a esperança de ainda ver na Junta Local.
Para fechar, a Revista traz o artigo sobre a padaria coletiva de Laura, João e Ruben, padeiros que cresceram e se conheceram na Junta Local. A história de como a iniciativa surgiu de forma espontânea entre estes jovens padeiros e revela o ethos colaborativo e o faça-você-mesmo da nova geração de empreendedores locais, que aspiram poder fazer o que querem sem sucumbirem a formatos mercadológicos tradicionais. É como se essa levedura estivesse no ar…
O Megafone agora se volta para nossas plataformas
A principal notícia da Junta Local neste começo de ano turbulento foi a fixação do Circuito Junta Local, um calendário com feiras em datas e locais fixos. A partir do mês de maio começamos a fazer feiras a cada primeiro domingo do mês na Rua Capistrano de Abreu, em Botafogo, e a cada terceiro domingo do mês na Praça Santos Dumont, na Gávea. Contamos ainda com feiras regulares na Chirst Church Rio, em Botafogo, ao lado do projeto Chega Junto.
O Circuito Junta Local é mais do que apenas um calendário. A regularidade de datas e locais representa um enorme ganho prático. Para produtores e nossa organização, a possibilidade de maior previsibilidade e facilidade no planejamento. Para o público, a clareza de saber onde e quando estaremos. Afinal, sempre nos reconhecemos enquanto feira e não evento. Feiras são locais de troca e interação regulares. Apesar de serem efêmeras, criam laços contínuos entre produtores e consumidores, entre campo e cozinha e dentro de bairros. São ocupações – importante dizer – públicas.
Em tempos de desgaste urbano após o catastrófico ciclo político e olímpico na cidade, fazer uma feira de rua representa uma forma modesta, porém convicta, de acreditar na ocupação da rua, da cidade, uma opção por não cair no ciclo vicioso de se acuar atrás de muros e dentro de shoppings. A feira é pública ainda no sentido de contar com a chancela e apoio do poder municipal, representado pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Emprego e Inovação, responsável pela organização das feiras da cidade. Com isso, reforça-se como política pública a necessidade de construir novas e mais curtas cadeias para um sistema alimentar mais justo e saudável. Como dissemos em uma postagem, reconhecemos que para muitos o consumo de comida boa, local e justa não faz parte do cotidiano, e fazer uma feira na rua não significa que estaremos, no curto prazo, mudando este cenário, mas não fazer a feira na rua certamente seria muito menos democrático.
Com nossa feira, principalmente na Rua Capistrano de Abreu, reforçamos também a conexão com a gastronomia. Temos a parceria do Polo Botafogo, que conta com alguns dos melhores restaurantes da cidade. O compromisso desses parceiros atuarem utilizando insumos da nossa comunidade representa uma nova frente criação de rede e também de potencialização da gastronomia a serviço da transformação. Uma costelinha de porco com purê de abóbora e queijo de cabra do Oui Oui virou costelinha de porco com purê de abóbora orgânica do Manacá e queijo de cabra do Capril DeVille, por um valor mais acessível que no restaurante.
Tudo mais delicioso e democrático
Enquanto isso, a Sacola Virtual segue seu crescimento incremental. Em maio realizamos novos testes de entregas em dois novos pontos: o Ateliê das Ideias, no Humaitá, e a Casa 7, em Copacabana. Assim, o objetivo é oferecer novos dias da semana e maior proximidade para nosso público. Como toda primeira experiência, as entregas podem ter momentos problemáticos, que, no entanto, são essenciais para o aprendizado e implementação de ajustes, algo que estamos fazendo de forma consistente com a contribuição de uma intrépida equipe de produtores e voluntários. Em junho também demos início à primeira experiência de delegação da curadoria e gestão da Sacola Virtual para outro grupo, a Primavera Vegana. É a Junta Local enquanto plataforma, utilizando a tecnologia de software e também o “chão” que desenvolvemos para permitir que pequenos produtores floresçam por toda parte.
Convidamos você, leitor, que provavelmente já nos conhece das feiras e das retiradas da Sacola Virtual, a se ajuntar agora através da nossa Revista. Comentários, sugestões e críticas serão bem-vindas pelo contato@juntalocal.com.
Boa leitura!
Crédito das fotos: Samuel Antonini