Por Maria Schatovsky

A tarefa de contar a história de cada produtor é sempre mais complexa do que imaginamos. Antes de efetivamente fazer parte da comunidade de ajuntados, nossa equipe de comunidade conhece, através de conversas ao vivo, online e materiais de divulgação, quem está por trás daquela marca ou negócio. Depois, passamos a nos ver atrás das barraquinhas nas feiras, discutindo nas nossas assembleias ou em outros eventos. Nesses quase 8 anos criando e fortalecendo nossa comunidade de produtores, através das visitas a produtores, dedicamos um tempo grande para ouvir e conhecer aquela história, um encontro que permite de fato mergulhar no universo de quem está por trás dos produtos que chegam nas diferentes plataformas da Junta Local.

Anna Paula e Maria Claudia são essas produtoras que estavam sempre nos convidando para conhecer a produção. “Vocês vão entender porque a gente só consegue fazer uma feira no mês”, “Sim, os chutneys e geleias são produtos tão importantes quanto a charcutaria”, “Vem ver de perto como a gente faz um salame”. Quem já conheceu essa dupla nas feiras já imagina a simpatia e o carinho que vinham juntos dessas frases.

E dessa forma, numa segunda de manhã, estávamos batendo no portão da Casa das Meninas Charcutaria Terra e Mar, em Paraty, no bairro de Ponte Branca, nos pés da Serra da Bocaina.

O sítio é onde Anna e Cláudia moram e produzem. Começamos a nossa visita pela horta e pomar, simbolicamente onde a Casa das Meninas começou. As meninas já tiveram carreira na televisão, na cozinha e por trás de CDJs e balcão de bares. Quando mudaram para o sítio, as possibilidades foram surgindo, e começaram a fazer geleias, antepastos e chutneys das frutas do pomar e das ervas e temperos da horta. Todos esses produtos ainda continuam sendo feitos, afinal aproveitar os insumos locais é a premissa, além da horta fornecer diversos conservantes naturais para os embutidos. Cláudia, que é quem fica com a mão na enxada, nos conta que durante a pandemia, ela aumentou os canteiros e fez algumas espirais de ervas – uma das técnicas de lidar com a umidade dessa cidade que fica entre a serra e o mar.

Na frente do pomar, fica o contêiner que foi adaptado para ser uma pequena cozinha industrial, onde é produzido toda a charcutaria, da terra e do mar, e os deliciosos potinhos recheados de invenções com ingredientes locais. As meninas, empolgadas, nos mostram a obra logo ao lado, que irá permitir a expansão da cozinha, e adequação a mais normas da vigilância sanitária, permitindo obtenção de novos selos que possibilitam a expansão das vendas. Além disso, a obra contempla uma cozinha-restaurante, com mesas e balcões, para que sejam feitos jantares e uma melhor visitação no sítio.

Passando pela beira do riacho, entramos, efetivamente, na Casa das Meninas, com uma grande cozinha aberta para sala que já exalava aromas inebriantes do que estava por vir. Começamos primeiro com uma degustação de diversos produtos que saem do sítio e chegam para a gente nas feiras, na Sacola da Junta e no Assina Junta.

Salame à caçadora – uma homenagem às mulheres, recriando um clássico da charcutaria – chutney de banana da terra produzida ali no quintal, lombinho defumado na pitmaster que tínhamos acabado de abrir, chutney de abacaxi orgânico produzido pelos vizinhos de Cunha, tapenade de palmito de bananeira aproveitando integralmente as bananeiras, copa maturada, baiacu – peixe local – curado, manteiga de siri – inspirada nas rillettes francesas – salame de atum com guanciale, misturando serra e mar e alguns outros preparos.

Desde que conhecemos a Anna e a Cláudia, ficamos empolgados com a charcutaria do mar delas, técnicas ainda pouco exploradas com esses insumos que transbordam dos nossos litorais. A dupla fez a primeira turma do curso da Escola de Alimentos do Mar, do Projeto A.mar, referência no Brasil nesta área. Em Paraty, elas viram a chance de usar a grande diversidade de espécies dos mares. Começaram com o boudin de camarão, a manteiga de siri, e a lula e os mexilhões defumados. Depois passaram a explorar mais a fermentação, resultando em um “Jámon” de atum fermentado com Koji e o salame de atum com guanciale, curado nas câmaras de maturação que ficam no sítio também.

Enquanto isso, a Anna ia preparando uma moqueca para o nosso almoço, e bebericávamos algumas bebidas locais, como cachaças e vermutes produzidos em Paraty. A visita foi curta e o desejo foi de voltar assim que saímos. Visitar produtores é sempre uma forma de reforçar nossos valores e princípios e nossos processos de curadoria. Temos que saber quem faz, de onde vem e como é feito, mas além de tudo estar perto de todo esse processo. Esperamos ainda ver muito tempo de Anna e Cláudia brincando e colocando sempre fogo no parquinho, com defumação e maturação.

Quer conhecer um pouco mais do trabalho da Casa das Meninas? Acesse a Sacola da Junta e garanta já seus embutidos e conservas.