A Junta Local tem como missão aproximar e ajuntar. Tentamos dar conta desse recado criando na cidade plataformas que sirvam a essa finalidade. Nossas feiras e a Sacola Virtual são mais do que eventos ou formas de compra online: são ferramentas de aproximação e ajuntamento criadas para e com os produtores com o propósito de tornar o sistema alimentar mais justo, saudável e humano. Ao longo dessa jornada pudemos conhecer melhor as pessoas por trás da nossa comida, mas o que vemos muitas vezes é apenas o resultado final de um longo caminho, que geralmente começa longe dos nossos olhos. Nos demos conta de que é preciso ir além.
Para de fato adentrar o mundo dos produtores e criar novos canais nem sempre basta criar espaço de fluxos na cidade, é preciso ir até eles, conhecer sua realidade. É preciso botar o pé na estrada e chegar junto. O interior do nosso país, ao qual por muito tempo demos as costas, guarda uma riqueza humana e natural que estamos começando a redescobrir, e cujo futuro estamos apenas começando a reinventar.
Com isso em mente, a Junta Local resolveu em setembro de 2015 se lançar na estrada para ver produtores in loco e trazer suas histórias até a nossa comunidade. A rota foi inicialmente traçada em busca de um produto especial: o queijo artesanal, emblemático do movimento de redescoberta do patrimônio gastronômico brasileiro, mas ao mesmo tempo um dos mais difíceis de acesso. Tivemos como guia Daniel Martins, do Queijo com Prosa, um dos pioneiros na valorização e divulgação da cultura queijeira no Rio de Janeiro. No caminho acabamos também passando por produções inusitadas, como os olivais da Oliq, e as estufas do Cogumelos Umami. Esse post inaugura um “diário de bordo” da viagem.
Antes de iniciarmos, um pouco mais sobre a redescoberta dos queijos artesanais brasileiros, cujo reconhecimento foi tardio fazendo com que os produtores por muito tempo se mantivessem isolados ou desistissem da produção, tendo em vista barreiras culturais (uma preferência por queijos importados, como se apenas esses fossem nobres) e sanitárias (as absurdas normas feitas para queijos industriais que dificultam a livre circulação do produto).
Primeiro veio o resgate dos queijos da Canastra, do Salitre e outras regiões de Minas, além de queijos típicos de outras regiões do país. O uso do leite cru preserva o melhor do terroir e das microbiotas; as técnicas tradicionais de fabrico e cura exploram a complexidade da fermentação, esse tênue limiar da decomposição que maximiza sabores. Por muito tempo, atropelados pelos queijos industrializados que (mal) imitam estilos estrangeiros e esnobados por um paladar com complexo de vira-lata, os mineirinhos vieram pelas beiradas até receberem o devido reconhecimento internacional.
Mas o queijo também aponta para o futuro e novos belos horizontes. Em todo território novos produtores, desgarrados da tradição e atraídos pelas múltiplas possibilidades do uso do leite, coalhos, lavagens e maturação buscam imprimir seus estilos ao queijo, indo ao encontro de um público cada vez mais ciente e ávido para explorar o potencial gastronômico nacional.
Essa combinação leva a um novo panorama queijeiro nacional. O mapa de todo território está pontilhado de novos produtores, cada um montando sua própria revolução contra as massas insossas que caracterizaram a produção nacional até pouco tempo.
A cartografia desse novo cenário no entanto permanece um desafio. A produção de queijo exige dedicação intensa, de modo que os produtores raramente se aventuram para longe de seus domínios. Em pleno século XXI, é preciso às vezes fazer como os tropeiros, se embrenhando pelas matas e seguindo as picadas (as nossas maltratadas rodovias estaduais) em busca do ouro lácteo.
A Junta Local por isso sempre contou com verdadeiros embaixadores dos queijos artesanais, como Túlio Mota, do Dariquim, e Daniel Martins, do Queijo com Prosa. Este foi nosso guia ao longo da viagem, nos apontando o caminho para produtores como Maristela Nicolelis (Fazenda Santa Luzia) e Mariana (Queijo Catauá). No caminho, aproveitamos para reencontrar outros produtores da Junta, cujas histórias traremos para perto ao longo dos próximos relatos.