Por Thiago Nasser

A Junta Local é uma comunidade que busca transformar o sistema alimentar através da comida boa, local e justa.
Acreditamos que comer é um ato transformador e que podemos melhorar as nossas vidas do ponto de vista individual e coletivo através de plataformas que redefinem as relações entre produtores locais e consumidores.

Estas são as linhas que você lê abaixo da pergunta “O que é a Junta Local?” em nosso flyer institucional e deixam bem clara nossa intenção de nos afiliarmos num movimento bem maior que pode ser intitulado de ativismo alimentar, seguindo a professora Elaine de Azevedo, a voz por trás do maravilhoso podcast Panela de Impressão e estudiosa do assunto (mais sobre isso aqui).

Mas por que isso? É bem simples: na nossa visão, ser ativista é algo incontornável, pois não é possível querer comida boa, local e justa e se dar ao luxo de torcer o nariz para a política. É preciso pensar na mudança e isso só se faz de forma coletiva.
Boa parte do tempo essa atuação se dá na esfera do dia-a-dia, fora do Congresso, das Assembleias e dos Ministérios, na chamada micro-política. Ela se dá na gôndola, na mesa de jantar aos domingos, na conversa do bar. Se você discute questões como acesso à comida sem veneno, procedência da comida, bem estar animal, sustentabilidade, veganismo, fortalecimento da agroecologia é bem possível que estas questões tenham sido trazidas para você por ativistas alimentares com o objetivo de que novas informações e visões informem seu comportamento e consumo. Na prática, é o que fazemos também. Trazemos e facilitamos o acesso a informações sobre produtores, questionamos o sistema alimentar propondo plataformas alternativas, pensamos nas feiras como forma de ocupação democrática da cidade, e por aí vai.

Ao longo do tempo começamos a entender também que é preciso participar de diferentes organizações, fóruns da sociedade civil para amadurecer nossa visão e participar de forma mais ativa. Além do cara a cara que toda nossa comunidade faz nas feiras, já fizemos parte de uma série de movimentos e mobilizações: abaixos assinados contra mudança nas leis de agrotóxicos, Banquetaço contra as políticas de fome e sucateamento do CONSEA, posicionamento a favor da rotulagem de transgênicos. Olhando ao nosso redor, hoje temos a parceria com a Gastromotiva e a Junta Solidária, somos parte da Comissão de Orgânicos do Rio de Janeiro, da World Farmers Markets Coalition. Aqui e acolá somos chamados a dar nossos pitacos e a mobilizar nossa comunidade, principalmente quando o assunto é o consumo local.

Mas, como ressalta a nossa querida Elaine, essa sub-política muitas vezes não sai desta seara o que pode gerar uma sensação de incompletude ou de frustração por não gerar mudanças mais sistêmicas. Afinal, mudanças exigem novas leis, novas políticas, novos pactos sociais e políticos em torno de valores e prioridades. E quem tem o poder de fazer isso tudo são os políticos eleitos dentro de um regime democrático. E se nós, da Junta Local, somos ativistas, é importante também trazer informações, se posicionar, discutir e debater dentro desta arena, através do nosso voto e das outras formas pelas quais é possível exercer pressão por mudanças.

E é aqui que as coisas se tornam mais confusas pois a norma era que não se falasse de política à mesa. Tanto em casa como no caso de empresas. Afinal, clientes podem não gostar, polêmicas vazias abundam, o mundo está “polarizado” e, como a política é fluida, um posicionamento hoje pode depois parecer equivocado. Mas chegamos onde chegamos muito mais por medo da política do que por uma aceitação da natureza da política, que é feita de encontros e desencontros, debates e complexidade.
E por isso amadurecemos deste ponto de vista também. Não nos furtamos a nos posicionar em relação a tópicos relacionados à política, principalmente quando são caros ao nosso movimento da comida. Não ficaremos omissos quando o que está em jogo é o nosso projeto de nação, a nossa utopia coletiva. A nossa envolve a erradicação da fome, uma campo mais integrado com a cidade, o apoio a sistemas agroalimentares que protegem a natureza, que trazem diversidade, sabor e a saúde à mesa que não explore minorias, que valorize o trabalho.

A política não deveria ser um monstrengo, não há alternativa fora dela. Ainda que não exista um “Partido da comida”, cada vez mais existem propostas relacionadas a isso e candidatos articulados a movimentos e causas desta linha. Tão essencial quanto falar que “comer é um ato político” e adotar práticas no dia a dia que reflitam isso, é praticar o ato político de votar. Principalmente nas esferas mais locais, um vereador, um deputado estadual atento a estas causas pode fazer a diferença, fiscalizando, fazendo projetos de lei e votando contra medidas prejudiciais do ponto de vista alimentar. Às vésperas destas eleições, publicamos alguns conteúdos na nossa Revista em que aumentamos o volume do nosso megafone para reforçar a necessidade de um olhar amplo da comida que passe pela política.

É por este motivo que estamos publicando este pequeno manual do voto para você que é um ativista alimentar poder se informar melhor sobre em quem votar e como fiscalizar agentes públicos o ano todo.

E não vamos nem entrar na questão na eleição presidencial, pois não é preciso de um manual para saber qual a melhor opção neste momento. Que o pesadelo inaugurado por Bolsonaro termine o quanto antes para que possamos voltar a sonhar com um Brasil de comida boa.