Na série Ajuntados da Junta apresentamos os nossos colaboradores.

A Junta Local ainda dava seus primeiros passos quando Guilherme Mattoso, autor do blog Caipirismo, nos enviou um e-mail apresentando sua página e perguntando se poderia fazer uma matéria conosco. Marcamos uma entrevista e a sensação foi de ter, no meio do concreto urbano, encontrado alguém que falava a mesma língua que a gente. Falamos o caipirês, a língua do “neorrural”, conceito e também personagem que expressa uma nova e desconhecida faceta do campo, em que gastronomia, ruralidade, tecnologia, solidariedade e multiplicidade se complementam.

Não só viramos seguidores assíduos do Caipirismo, mas também convidamos o Gui, que acaba virar pai da Maria Clara, a ser colaborador da Revista da Junta. Com ele estamos sempre dialogando sobre livros e conceitos “cabeça”, mas também de olho no que está acontecendo de fato com o campo e outras iniciativas.

Confira a entrevista que fizemos com ele.

Como surgiu seu interesse pela Nova Ruralidade? Explique um pouco mais sobre o conceito.
Até começar a trabalhar com projetos ligados à agricultura familiar, eu pouco sabia sobre este universo. Ao ter contato com as realidades dos interiores do Brasil, descobri um outro país e passei a ver o campo de uma outra maneira, muito diferente da visão urbana que o enxerga como um lugar atrasado e parado no tempo.

O meio rural é um espaço em profunda transformação e estas mudanças muito me interessaram e me levaram a estudar o chamado “Novo Rural”. Trata-se de um termo estabelecido no meio acadêmico que redefine o que é o rural na atualidade. Ele está atrelado à ideia de que as áreas rurais já não se restringem somente à agropecuária ou agroindústria. Estas, agora, dividem espaço com um conjunto de atividades ligadas ao lazer, prestação de serviços e até à indústria, diluindo, cada vez mais, os limites entre o rural e o urbano.

Hoje, no lugar do “Jeca Tatu”, com sua vidinha pacata, encontram-se, por exemplo, famílias que são altamente multifuncionais e pluriativas, ou seja, além de plantar tomates ou criar gado, desenvolvem funções, como serviços de assistência técnica, turismo rural e conservação ambiental, entre outras.

E o blog Caipirismo? De onde vem esse nome e de que forma ele aborda o neorrural?
Até criar o blog, há quase dois anos, eu tinha mil ideias fervilhando na cabeça, mas faltava um nome. Já tinha tudo definido: as temáticas, possíveis pautas e tal… e nada de nome! Foram meses sem inspiração até eu ler a palavra “caipirismo” em um artigo. Achei altamente sonoro e sugestivo. Corri atrás da definição (“ação, atitude, modos, costumes, próprios de caipira…”) e não é que, além de bonito, o termo serviu perfeitamente para tudo o que eu estava pensando!

O conceito de neorruralismo, por sua vez, que fala sobre o movimento de pessoas que deixam a cidade para buscar novas oportunidades no campo, surgiu quase naturalmente nos meus posts, uma vez que ele se insere nas quatro temáticas que abordo no blog, que são o turismo rural, alimentação, sustentabilidade e o já citado novo rural. É um termo muito interessante, pois expressa a ideia de valorização de um modo de vida que antes parecia antiquado, mas, na verdade, é muito inovador. Quando um cara decide largar tudo para ir para a roça em busca de mais qualidade de vida, ele reforça valores próprios do campo e também transforma-o, contribuindo significativamente com o desafio de manter o meio rural vivo, dinâmico e, sobretudo, habitado.

Qual a descoberta mais interessante que você fez desde que começou esse trabalho?
Seria injusto eleger apenas uma descoberta. Desde que comecei a escrever, foram muitos os felizes encontros que tive, seja com pessoas ou organizações que estão inovando e fazendo coisas incríveis.

Recentemente, conheci o trabalho do suíço Ernst Götsch, que há trinta anos iniciou, no sul da Bahia, um projeto absurdo, batizado de Agricultura Sintrópica. É de se admirar o que ele tem feito com sistemas agroflorestais, que ao mesmo tempo regeneram regiões degradadas e tornam o solo super produtivo.

A Associação Acolhida na Colônia, em Santa Catarina, é uma experiência que eu já conheço há mais tempo e tenho profunda admiração. Através do agroturismo, eles conseguiram transformar uma região antes esquecida e esvaziada em um dos mais interessantes roteiros de turismo rural que se tem notícia.

E tem também o pessoal do Clube Orgânico, que está pertinho de mim, aqui no Rio, com uma proposta simples, porém, muito inovadora ao repensar o consumo e a sustentabilidade dos territórios rurais através da alimentação orgânica.

De que forma a Junta Local se encaixa nesse conceito?
A Junta Local foi mais um desses felizes encontros. O Caipirismo e a Junta começaram quase juntos e têm objetivos em comum totalmente entrelaçados. As feiras e a Sacola Virtual tornaram-se um case, pois reúnem muitos dos temas e ideias dos quais procuro compartilhar no blog. Alimentação, inovação, sustentabilidade… está tudo lá! Através da comida, a Junta tem fomentado na cidade toda uma agenda sobre segurança alimentar, locavorismo, CSA, consumo consciente… temas que, até pouco tempo, ninguém falava ou pensava sobre. Isso é muito significativo para mim.

O que não falta na sua Sacola da Junta Local?
Bom, a lista aqui seria enorme, mas eu destacaria as pastas e molhos do Atelier no Jardim – aliás, gosto de tudo o que eles fazem; os pães da The Slow Bakery; os antepastos Italia in Barattolo; as cervejas Hocus Pocus; e o patê de fígado de aves Green Man Farm. Também não posso deixar de mencionar os doces da Quinta do Queirós, da minha família de Quissamã.

Crédito da foto: Red Werneck