Por Thiago Nasser e Alice Lutz

Para a receita desta semana convidamos uma pessoa que recentemente passou por muitas transformações –  e o milho faz desta história. Alice Lutz, nossa ajuntada da Maravilhas São José e colaboradora desta Revista, resolveu deixar a cidade e se instalar definitivamente no Sítio São José, na Serra da Bocaina. Aqui na Revista já pudemos nos deleitar com seus relatos líricos sobre a aproximação não apenas com o campo e a natureza, mas sobretudo com ela mesma. Uma de suas descobertas nesse processo foi o milho, como ela também já nos contou aqui. Não o milho dos campos a perder de vista, o milho que é engolido por máquinas, mas o milho crioulo que se mistura com outros cultivo e é ele mesmo o resultado de misturas e mestiçagens. Milho debulhado à mão. Milho colorido e perfumado. Não o milho que vira óleo ou insumo anônimo, mas o milho que é processo através de técnicas que os recantos do Brasil caipira teimam em preservar.
Seria impossível abordar o milho na nossa série sem trazer um pouco desse olhar tão rico, e a Alice nos trouxe tudo isso em suas receitas, práticas mas também testemunhas da nossa cultura. Perfeito para a família fazer e aprender junto.
Aproveitem e recomendamos que seja usado plantado e moído pela própria Alice, disponíveis na Sacola da Junta.


Receita 3×1: Angu cremoso, Sopa de pântano e angu frito

Escolhi colocar essas 3 receitas “juntas” pois mostram a grandiosidade do milho como ingrediente. Aqui em especial, da farinha de milho, o fubá.  Por questões tristes da nossa história, o fubá até hoje não é dado seu devido valor e acaba por muitas vezes não fazendo parte da lista de ingredientes de nossas casas.  Portanto devemos nos debruçar em reverência aos indígenas, quilombolas, caipiras e todo povo com tremenda sabedoria ancestral respeitosa de cultivo e preparo de alimentos que contam a nossa história. Devemos adentrar o interior de ser brasileiro.

Neste combo de receitas carregadas de muito amor em memória por mim busquei trazer e mostrar a facilidade e versatilidade não só do fubá mas da receita e técnica em si.

Todo angu cremoso pode virar angu crocante frito e também uma divina sopa de pântano (é por esse nome que a conheço desde a infância).

Sugiro uma base de refogado e ervas mas vale usar a imaginação nestes preparos – podendo ser realizados, apenas com água, sem nem colocar sal. Até preparados com base em caldo de legumes, com manteiga, queijos, verduras e tudo mais.  São essas ótimas opções para dar graça a sobrinhas de geladeira. 

 

Angu cremoso (mais conhecido por polenta, mas pra mim é angu)
(Serve até 4 pessoas)

Ingredientes:

250g de fubá
400 g água quente
30g azeite de oliva (ou manteiga sem sal e de vacas felizes)
100g cebola
10g alho amassado
ervas a gosto: usei aqui orégano fresco e manjericão
Sal a gosto

Modo de preparo:

Coloque a água em uma chaleira para ferver.

Em uma frigideira torre o fubá, mexendo sempre para não queimar. Quando o cheiro de pipoca invadir seu ar desligue e reserve.  Em uma panela refogue em um fio de azeite, cebola, alho e acrescente as ervas frescas e um pouquinho de sal para ajudar a murchar a cebola. Acrescente o fubá torrado, misture bem e vá adicionando aos poucos a água quente. Mexa vigorosamente com a ajuda de um fuê.  Coloque o fogo médio pra baixo e siga mexendo. Incorpore em fio aos poucos o azeite e o restante da água quente. Guarde a última parcela do azeite para finalização. Mexa vigorosamente até que a mistura esteja fervendo e completamente cozida (você vai perceber como os grãos da farinha passam a ficar bem abraçados e homogeneos).  Apague o fogo e coloque a última leva de azeite, ajuste o sal, sirva rapidamente bem quente e maravilhe-se.  

Dica: No final é possível colocar no angu bem quente e misturar para que cozinhe no calor uma infinidade de ingredientes como agrião, bertalha, folhas de jambu, espinafre, escarola, cambuquira, caruru ou ainda um bom queijo como um canastra bem curado. 

 

Angu frito/ Polenta frita 
(Serve até 4 pessoas)

A mesma receita do angu cremoso.

Ingredientes:

250g de fubá
400 g água quente
30g azeite de oliva (ou manteiga sem sal e de vacas felizes)
100g cebola
10g alho amassado
ervas a gosto: usei aqui orégano fresco e manjericão
Sal a gosto

Modo de preparo:
Depois que seu angu estiver pronto.  Espalhe em um pirex ou tabuleiro untado, cubra e leve a geladeira por 2 horas (no mínimo).
Retire da geladeira. Aqueça óleo para fritar. Em um prato raso espalhe um pouco de fubá misturado com uma pitadinha de sal. Corte o angu em tiras, cubinhos ou como preferir. Empane no fubá e frite em óleo quente ou asse em forma untada (de preferência antiaderente) em forno pré aquecido a 200º.

Sirva quente como petisco ou para completar uma refeição e maravilhe-se.

 

Sopa de pântano/ Sopa de fubá com couve 
(Serve até 4 pessoas)

Sou apaixonada por essa sopa. Só depois de um tempo que entendi a diferença entre caldo verde e essa sopa. Por toda a minha infância na fazenda, a alegria de sentir o perfume da cozinha de fogão a lenha, aquecendo a chegada da noite fria. No caldeirão uma linda e cremosa sopa de fubá só esperando a couve fininha pra ser devorada.
A base da receita é a mesma das anteriores. Podendo inclusive ser feita com sobra de angu que ficou na geladeira e você como eu adora ter motivo para transformar sobras em outras maravilhas. 

Vou repetir mesmo assim para quem quiser preparar diretamente a sopa desde o início. 

Ingredientes:
250g de fubá
650g água quente
5 folhas de couve mineira (ou outra, podendo inclusive usar as folhas do brócolis por exemplo)
30g azeite de oliva
100g cebola
10g alho amassado
ervas a gosto: usei aqui orégano fresco e manjericão
Sal a gosto
Pimenta do reino a gosto

Coloque a água em uma chaleira para ferver.

Em uma frigideira torre o fubá, mexendo sempre para não queimar. Quando o cheiro de pipoca invadir seu ar desligue e reserve.  Em uma panela refogue em um fio de azeite, cebola, alho e acrescente as ervas frescas e um pouquinho de sal para ajudar a murchar a cebola. Acrescente o fubá torrado, misture bem e adicione ¾ da água.  Em fogo baixo, misture bem para que o fubá incorpore a água e deixe cozinhar. Quando ferver, acrescente o restante da água, ajuste sal e pimenta do reino. Com um mixer ou no liquidificador bata a mistura bem, volte para a panela, aqueça na hora de servir incluindo um bom punhado de couve picada bem fininha.  Maravilhe–se. 

Dica: Fica excelente para este preparo incluir milho verde cozido. Caso deseje é só substituir a água do preparo pelo caldo do cozimento do milho verde. E acrescentar milho debulhado de 2 espigas à mistura antes de processar com mixer ou liquidificador.
Caso queira fazer a partir da sobra do angu, basta aquecer o que estava na geladeira com água, bater com mixer ou liquidificador até ficar cremoso, esquentar, incluir a couve e maravilhar-se. 

 

Farofa de bola / Engasga galo 

Aqui na roça, carinhosamente chamam essa farofa feita com fubá de engasga galo. Logo que conheci me vi chorando a lembrar dos dedinhos tortos do meu vô a mexer sua tão divina farofa de bola feita com farinha de mandioca. E como gosto do encontro, reuni as duas maravilhas e aqui compartilho com vocês a minha versão dessa mistura feita com fubá.  

A receita que segue é feita com a minha combinação de temperos favorita para essa receita, mas novamente reforço que pode ser feita com o que você quiser e tiver em casa. 

*Para aqueles que não gostam de coentro, sugiro tentar provar o coentrão (agrião do pará). Dizem que ele ajuda os coentrofóbicos a se apaixonarem por essa explosão de sabor.

Ingredientes

200g de fubá
100g de cebola
140g de água gelada
Azeite 10 ml
Suco de meio limão galego (pode ser outro)
5 folhas Coentrão ( agrião do pará)
5 flores de jambu
1 belo punhado de salsinha
Flores tagete (1 unidade) e Cravina (4 unidades)
Sal a gosto

Modo de preparo

Em uma frigideira torre o fubá, mexendo sempre para não queimar. Quando o cheiro de pipoca invadir seu ar, desligue e coloque em uma cumbuca larga para esfriar. 

Pique a cebola em cubinhos. Neste caso acho importante a picância da cebola e por isso uso ela crua sem demolho. Mas caso você não goste e queira suavizar, pique a cebola e deixe de molho  em água por pelo menos 30 min.  Pique o coentrão, salsinha e flor do jambu ( importante picar folhas bem secas para não amargar e alterar o sabor fresco que precisamos aqui) 

Com o fubá já frio, acrescente a cebola picadinha, metade do azeite, o coentrão, jambu e salsinha picados. Com a ponta dos dedos vá misturando bem a farofa enquanto vai colocando a água gelada. Formando ao mexer bolotas de tamanhos variados.  Ajuste sal, coloque o restante do azeite e suco de limão, misture. Incorpore as pétalas da cravina e tagete. Misture bem e maravilhe-se.  Neste caso, misture sempre com a ponta dos dedos – este é o ingrediente secreto da receita. 

 

Bolo de fubá

Este bolo é meu xodó. Me aproximou de pessoas que mudaram minha vida, meu olhar. Pessoas como nosso amigo Vicente que mesmo não estando mais por aqui, seguem nos inspirando e encorajando a seguir.  Todas as vezes que preparo esse bolo ofereço para ele e para minha amada Ialorixá Nivia Luz. 

Um bolo simples, onde como sempre a diferença está na qualidade dos ingredientes, em especial neste caso do fubá. 

 

Receita:

1 e ½ xícara de fubá (250g)
1 e ½ xícara de leite de coco (200ml) . Caso faça o leite em casa, é importante que o mesmo seja feito bem denso. Se for aguado pode alterar a qualidade da receita.
2 ovos de galinhas felizes ( +- 100g)
3/4 xícara de açúcar demerara (120g_pode dimunir até 80g se desejar)
½ xícara de óleo de coco (pode ser óleo de girassol e outros) (100ml)
1 e 1/2 colher de sopa de fermento em pó (12g)
1 pitada de sal marinho (pitada é o quanto de sal cabe na junção do seu dedão com o indicador)

Modo de preparo:

Pré aqueça o forno a 180º. Unte a forma de sua preferência com óleo e polvilhe açúcar demerara, batendo bem para que toda a forma fique com uma película de açúcar.
No liquidificador adicione todos os ingredientes menos o fermento e bata bem até alcançar uma massa lisa e homogênea. Se for necessário use uma espátula para incorporar as laterais do liquidificador, a massa. Transfira a massa para uma cumbuca, acrescente o fermento, Misture delicadamente com a ajuda de um fuê. Coloque na forma untada e leve ao forno para assar por em média 45 minutos.  Só abra o forno para conferir depois de no mínimo 30 minutos. Quando o cheiro de milho fizer seu coração disparar é sinal de que seu bolo deve estar pronto. Faça o teste do palito. Retire do forno. Aguarde 5 minutos para desenformar. Passe um bom cafézinho ou um belo chá e maravilhe-se. 

P.S: Fica também maravilhoso incorporar milho verde cozido nesta receita. Caso queira acrescente 50g de milho cozido a mistura no liquidificador e caso necessário coloque um pouco mais de fubá. 

Veja aqui todas as receitas da nossa série.